Esforçava-se para manter o controle, para se lembrar de quem era. Cada dia que passava se sentia mais confusa e não conseguia lembrar-se de nada, nem de que seu nome era Juliana. Na esperança de que sua memória voltasse ela olhava para todos os cantos da casa tentando reconhecer algum objeto, algum retrato, mas nada acontecia e isso já estava lhe causando uma grande angústia.
Sofrera um acidente andando de bicicleta na ciclovia no calçadão da praia chocando-se com um rapaz que vinha na contra mão, caindo e batendo com a cabeça no meio fio. Depois disso e após ser medicada concluiu-se que fora acometida por amnésia. Agora só o tempo e retornando ao seu meio de convívio é que poderia, a qualquer momento, começar a recuperar a sua memória.
Era hábito de Juliana sempre que saia para pedalar de levar um documento o que a identificou fazendo com que localizassem a sua irmã com quem morava num apartamento perto da praia.
Sua irmã Carol era psicóloga e desde o acidente estava sempre contando sobre elas que nasceram numa cidade no interior de Minas, que estavam morando juntas no Rio porque vieram cursar a Faculdade e depois que se formaram resolveram continuar a morar na Cidade Maravilhosa. Juliana havia se formado em administração e trabalhava numa empresa de grande porte onde estava de licença médica e só retornaria depois que estivesse recuperada.
Tinha mais de um mês que tudo isso havia acontecido e três vezes por semana sua irmã a deixava sozinha no apartamento porque dava atendimento aos seus clientes no consultório.
Sempre que ficava sozinha ficava falando sozinha e parecia até que reclamava dela mesma. Dizia olhando para o espelho:
- Não posso tomar minhas próprias decisões ou tomar qualquer uma com precisão. Parece que voltei a ser criança e tudo que faço é controlado. Não consigo ficar aqui parada sem fazer nada.
Depois de ficar algum tempo se olhando no espelho e tagarelando com ela mesma resolve se ocupar com outras coisas. Resolve passar o tempo revistando seus pertences, revirando tudo que encontra. Um dia ela criou coragem para colocar em ordem as suas roupas. Tirou tudo do armário e começou a olhar uma por uma e foi no puxar de uma das peças que algo caiu no chão. Abaixou para pegar e viu que era uma chave antiga com um laçinho de renda na ponta.
Levantou-se e olhando para a chave sentiu que lhe era familiar. Continuou olhando fixa para aquela chave, olhava atentamente e sua mente começava a identificar que algo era familiar. Dizia para si mesmo:
- Essa chave parece ser de um guarda roupa antigo ou de uma caixa. - Ou de um baú... ou ...
- É isso mesmo, me lembrei é a chave do meu baú – disse eufórica e com a voz rouca.
- É a chave do meu baú onde deixei guardado o meu diário, as minhas recordações de criança e outros objetos.
- Deixei em casa antes de vir para o Rio e trouxe a chave comigo para que meus pais não ficassem curiosos em saber dos meus segredos – falou toda feliz.
– Ôba, comecei a me lembrar de alguma coisa e acho que isso é bom e quero logo contar para Carol.
Juliana começou a se lembrar aos poucos de todos os detalhes e com a ajuda da sua irmã foi progredindo. Elas resolveram visitar os pais não só para matar as saudades, mas também para que Juliana pudesse rever os lugares de sua infância, sua adolescência, abrir o seu baú, reler o seu diário e recordar, através de seus objetos, momentos que ainda pudessem estar esquecidos em sua memória.
Graças à chave do seu baú secreto Juliana começou a se recuperar da amnésia e em pouco tempo já estava novamente trabalhando e com uma memória privilegiada.
RSantos
Tema: Armário
6a. Edição Musical -
Música: "Playing God - Paramore"